ANTÔNIO E SEVERINO: OS MAIORES GÊNIOS DAS LETRAS ARARUNENSES.

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Antônio Joaquim Pereira da Silva  (1876-1944) nasceu em Araruna, Paraíba e faleceu no Rio de Janeiro, cidade onde viveu e participou do movimento simbolista. Formado em Direito, foi promotor público no Paraná. Foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.

Obra poética: Solitudes (1918), Beatitudes (1919), Senhora da Melancolia (1928). 


CHOPIN ...  LISZT ... BEETHOVEN ...

Vem-me da noite, e como dela oriundo,
Um desempenho magistral ao piano,
Chopin... Liszt,,, Beethoven... que fecundo
Ventre de dor – o vosso gênio humano!

Bem vos compreendo.E ao músico e profundo
Rumor do vosso gênio diluviano,
Levais-me soluçando, além do mundo,
Entre os maroiços vivos de outro oceano.

Conosco, sim, tudo se me afigura
Imenso, imenso, até minh’alma que erra
Nas subjetivas sombras da loucura...

E a noite, a própria noite se desceria
Para escutar, silenciosa e obscura,
Os soluços sinfônicos da Terra.


         Solitudes (1918)


CONTEMPLANDO O CÉU

Contemplo o céu noturno  - o belo, fundo,
Constelado esplendor que me fascina
E me faz pressentir que tudo é oriundo
Do só poder da emanação divina.

Agora, neste instante, me domina
Uma única idéia: é que se o mundo
É vil e a nossa mente pequenina,
O sentimento humano é bem profundo!

Que importa a Dor? Que importa a imensidade
Implacável da Dor num tal momento,
Em que a graça dos deuses nos invade

Se, de espírito em êxtase, olhar fito
Nos céus – gozamos o deslumbramento
De ser outro infinito ante o infinito?

                            Beatitudes (1919)

 

Severino Peryllo Doliveira nasceu na antiga povoação de Cacimba de Dentro, município de Araruna, em 4 de dezembro de 1898. Era filho de Almeno Peryllo de Oliveira e Josefa Maria de Oliveira.
Mulato, órfão de pai aos três anos de idade, saiu de Araruna aos 15 anos, atraído pela atriz italiana Irene Conceptini, que aparecera em Araruna dirigindo uma Companhia de Variedades.
Entre 1913 e 1917 trabalhou em várias companhias artísticas pelos palcos do Nordeste.
Em 1917, estreou no Teatro São José, no Rio de Janeiro, onde foi trabalhar na Companhia de Brandão Sobrinho.
Em 1920, fez uma tounée pelo interior do Brasil desde o Norte de Minas até o Rio Grande do Norte.
Na sua sofrida vida de ator, trabalhou nos teatros Trianon e República, do Rio de Janeiro, ao lado de artistas como Amalia Capitani, Irene Conceptini, Candida Palace, Ferreira de Souza, Leopoldo Fróes, todos eles, nomes consagrados nos palcos.
Em maio de 1920, chegou à capital da Paraíba, completamente anônimo.
Até 1923, dedicou-se à vida teatral. Depois, ingressou na imprensa e na vida literária, onde se tornou conhecido, tendo sido um dos iniciantes, na Paraíba, do movimento literário modernista.
Conseguiu publicar seus primeiros versos na revista Era Nova, periódico que marcou época na vanguarda do movimento modernista e agregava nomes como Américo Falcão, José Rodrigues de Carvalho, José Américo de Almeida, Ademar Vidal, Eudes Barros, Sinésio Guimarães, Silvino Olavo e outros.
Integrou-se ao corpo de auxiliares da Revista e passou a assinar uma "crônica social" na coluna Noticiário Elegante, depois, uma coluna Notas de Arte. Escreveu uma série de crônicas intituladas "Cidade dos Jardins", sob o pseudônimo de Paulo Danízio.
Em 1925, publicou seu primeiro livro"Canções que a Vida me Ensinou", onde predominava a temática da poesia simbolista. Esse livro lhe valeu uma versão para o espanhol, editado na Argentina.
Além de ator e poeta, Peryllo era pintor e costumava pintar os cenários de seus festivais de artes. No livro "Canções que a vida me ensinou", a capa e as ilustrações são do próprio autor.
Em 1927, viajou para o Rio de Janeiro onde foi recebido por seu conterrâneo de Araruna, Pereira da Silva, por Ademar Tavares, Theo Filho e outros do mundo literário carioca.
De volta à Paraíba, fez excursão ao Norte recebendo no Pará uma verdadeira consagração às suas qualidades de poeta e ator. Com o mesmo êxito foi recebido no Amazonas.
Em 1928, publicou "Caminhos Cheios de Sol", talvez, sua melhor obra, e onde se mostra definitivamente alinhado ao espírito renovador da literatura brasileira.
Em fins de 1928, o poeta já se sentia doente; a tuberculose minava-lhe o peito. Tentando melhoria para a sua saúde transferiu-se, com seu modesto emprego, da Secretaria de Administração do Governo para a Mesa de Rendas de Monteiro.
Em 1929, escreve "A Voz da Terra", dedicado ao presidente João Pessoa, seu último trabalho.
Em junho de 1930, já bastante doente, deixa o trabalho e vem morar em companhia de sua genitora. Às primeiras horas do dia 26 de agosto de 1930, aos 32 anos, faleceu em sua residência, à avenida 12 de outubro, no bairro de Jaguaribe.
Alguns poucos amigos e vizinhos acompanharam Peryllo ao cemitério Senhor da Boa Sentença, onde falou na despedida o poeta Leonel Coelho.
Foi esse o poeta Peryllo Doliveira que os escritores João Lélis, Eudes Barros, Silvino Olavo, Celso Mariz, Ascendino Leite, Eduardo Martins e muitos outros tão bem o biografaram. 





Do livro:
CANÇÕES QUE A VIDA ME ENSINOU
Eu amo a vida pela glória de viver.
Eu amo a vida na harmonia dos meus versos
e na grandeza do meu sofrimento.
Amo-a, pelos instantes de tristeza
e pelas horas de melancolia,
e pelos sonhos místicos que andam dispersos
nos silêncios ignotos do meu ser.
Amo-a por tudo quanto vejo,
por tudo quanto sinto
- pela efêmera alegria
que nasce e morre mum momento,
pela esperança que não chega a ser desejo,
pelo desejo que não chega a ser instinto...
E a vida, recompensando o meu amor,
todos os dias canta aos meus ouvidos
uma nova canção
de glorificação
à minha dor.
A sua voz, então,
fica nos meus sentidos,
ressoando,
num ritmo lânguido de sonho,
a se espalmar
suavemente...
devagar...
A voz da vida fica na minha alma
qual numa concha a voz do mar.
E a minha alma recorda, sem saber,
todas as coisas lindas que sonhou
e, a reviver
o que ficou atraz, no meu caminho,
vai cantando baixinho...
vai cantando as canções que a Vida me ensinou...


DA VILA BRANCA EM QUE NASCI
a Gustavo Torres
Erguida sobre o dorso azul da Borborema,
a vila em que eu nasci
é um luminoso, um pequenino poema
de encanto e graça. Nas manhãs claras de verão ardente,
quando o Sol, como um deus adolescente,
entre carícias fúlguras, a abraça,
ela esplende e sorri.
É que o Sol nela tem a noiva amada,
a Preferida, a Eleita
da sua luz, do seu amor.
Todos os dias ela o espera, insatisfeita,
ansiosa de carinho e de fulgor,
guardando em cada boca, em cada
ninho um sonoro canto de alegria
com que celebra a glória da Alvorada,
o triunfo esplêndido da Luz.
E que deslumbramento na cenografia
da paisagem que os olhos inebria!
E que milagre de harmonia
o Sol na alma dos pássaros produz!
Sobre ela a Noite tece,
com as suas mãos de sombra, uma grinalda
de estrelas luminosas
ou desfralda
um véu mirífico de luar.
E as casas, brancas, silenciosas,
sob o brilho dos astros reluzentes,
parecem monjas penitentes
que estão de joelhos, a rezar.
Na penumbra das minhas nostalgias,
evoco-a, beijo-lhe a lembrança.
Oh, as minhas primeiras alegrias,
alegrias ruidosas de criança
que, por instinto, canta e ri...
e a minha adolescência, o Sonho pleno de ânsias,
os meus silêncios íntimos de poeta,
os primeiros desejos da alma inquieta,
as primeiras angústias que sofri...
e as horas longas em que meu olhar
auscultava o mistério das distâncias,
a interrogar, a interrogar...
Mais tarde, apenas a tristeza
de ver a minha aldeia desaparecer
ao longe, sob a névoa fina
do amanhecer,
e o esfumado perfil de uma colina
a se interpor
entre ela e a minha dor.
Hoje, na tela de oiro da memória,
meu pensamento descortina
a minha aldeia, branca e pequenina,
num fundo de paisagem merencória...
E ao recordá-la, sinto que me invade
uma suavíssima melancolia
que se espalma
e se amplia
na beatitude do meu mundo interior...
A vila em que nasci é uma iluminura
que fulgura
dentro em minha alma,
no Livro de Horas da Saudade.
E há de sempre fulgir, em luz, em cor,
em beleza e em perfume,
porque na sua imagem se resume,
do modo mais completo,
a história emocional do meu primeiro afeto
que é a aleluia auroral da minha vida,
a música sagrada só por mim ouvida
porque é a canção primaveril do meu amor! 

FONTES: http://www.casadamemoriaararuna.com/principal.htmhttp://www.antoniomiranda.com.br/index.html
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